sexta-feira, 14 de junho de 2013

Bio- Raul Seixas " O Moleque Maravilhoso".


  Raul Seixas- O Moleque Maravilhoso.
Maria EugĂȘnia Pereira dos Santos era uma garotinha bonita quando conheceu Raul Varella Seixas. Ela tinha sete anos, e ele nove. O namoro, que durante anos ficou somente na troca de olhares e bilhetinhos, culminou no casamento dos dois, Ă s 17:30h do dia 16 de setembro de 1944, na Igreja do Bonfim, em Salvador, na Bahia. Nove meses apĂłs a uniĂŁo de Raul e Maria EugĂȘnia, nascia o primeiro filho do casal, Raul Santos Seixas, em 28 de junho de 1945.“Nasci baiano mesmo, na av. 7 de setembro, nĂșmero 108, que Ă© a avenida principal de Salvador. Hoje estĂŁo comendo bacalhau no quarto onde nasci.” brincaria Raul, mais tarde, referindo-se ao Restaurante PortuguĂȘs, que funciona hoje, na casa em que nasceu.A vasta biblioteca de seu pai era seu brinquedo favorito. E foi daĂ­ que veio o gosto pela palavra e a miopia precoce. Vivia trancado no quarto devorando o “Livro dos PorquĂȘs” do “Tesouro da Juventude”. Inventava histĂłrias fantĂĄsticas que, transformadas em gibis, e com desenhos do prĂłprio Raul, eram vendidos ao irmĂŁo caçula, Plininho (PlĂ­nio Santos Seixas, trĂȘs anos mais novo). MelĂŽ era o personagem central de suas histĂłrias, um cientista louco que viajava no tempo com figuras histĂłricas, Deus e o Diabo.“Eu estava muito preocupado com a filosofia sem o saber (isto Ă©, eu nĂŁo sabia que era filosofia aquilo que eu pensava). Tinha mania de pensar que eu era maluco e ninguĂ©m queria me dizer. Gostava de ficar sozinho. Pensando. Horas e horas. Meu mundo interior Ă©, e sempre foi, muito rico e intenso. Por isso o mundo exterior naquela Ă©poca nĂŁo me interessava muito. Eu criava o meu.”No ano de 1954, Raul ganhou seu primeiro violĂŁo, presente dos pais, ao qual, a princĂ­pio, ele nĂŁo deu muita importĂąncia. PorĂ©m, pouco a pouco, foi dedilhando e, sozinho, aprendeu a tocar algumas mĂșsicas, acabando por se apaixonar pela novidade.A famĂ­lia Seixas mudou-se para uma casa que ficava prĂłxima ao Consulado Americano. Ali Raul conheceu os garotos do consulado, que lhe emprestaram alguns discos de Elvis Presley, Little Richard, Fats Domino, Chuck Berry etc. Foi o primeiro contato com o Rock and Roll.“Eu ouvia os discos de Elvis Presley atĂ© estragar os sulcos. O rock era como uma chave que abriria minhas portas que viviam fechadas. Usava camisa vermelha, gola virada para cima. As mĂŁes nĂŁo deixavam as filhinhas chegarem perto de mim porque eu era torto como o James Dean. Olhava de lado, com jeito de durĂŁo. Cada vez que eu cumprimentava uma pessoa dava trĂȘs giros em torno do prĂłprio corpo. Eu era o prĂłprio rock. Eu era Elvis quando andava e penteava o topete. Eu era alvo de risos, gracinhas, claro. Eu tinha assumido uma maneira de vestir, falar e agir que ninguĂ©m conhecia. Claro que eu nĂŁo tinha consciĂȘncia da mudança social que o rock implicava. Eu achava que os jovens iam dominar o mundo.”Aos poucos a escola foi ficando de lado. O bom era ficar na loja Can-tinho da MĂșsica, curtindo rock and roll ou marcando ponto no Elvis Rock Club, fĂŁ-clube de Elvis Presley, fundado por Raulzito e o amigo Waldir SerrĂŁo. Corria o ano de 1962 e a necessidade de fazer rock levou Raul a fundar, ao lado dos irmĂŁos DĂ©lcio e Thildo Gama, o grupo Os RelĂąm-pagos do Rock. Chegaram a se apresentar na TV Itapoan, onde foram chamados de cantores de “mĂșsica de cowboy”.“Eu era um fracasso na escola. A escola nĂŁo me dizia nada do que eu queria saber. Tudo o que eu sei, eu devo ao mundo, Ă  rua, Ă  vivĂȘncia e, principalmente a mim mesmo. Repeti 5 vezes a 2ÂȘ. sĂ©rie do ginĂĄsio. Nunca aprendi nada na escola. Minto. Aprendi a odiĂĄ-la.”O ano de 1964 foi importante para Raul Seixas. Os RelĂąmpagos do Rock, com nova formação, passam a se chamar The Panthers. Foi tambĂ©m o ano da profissionalização definitiva e da des-coberta dos Beatles.Ainda em 1964, The Panthers entra em estĂșdio para gravar aquela que viria a ser a primeira gravação oficial: duas mĂșsicas para serem lançadas em um compacto (“Nanny”/ “Coração Partido”) pela Astor, que acabaram ficando apenas no acetato, nĂŁo sendo lançadas comercialmente. Somente em 1992, a mĂșsica “Nanny” seria lançada, entre outras gravaçÔes raras, no ĂĄlbum O BaĂș do Raul.O grupo passou entĂŁo a se chamar Raulzito e Os Panteras. Depois de comprar uma aparelhagem nova e melhor, passou a tocar em boates e em shows em que, muitas vezes, brilhavam astros da Jovem Guarda como Roberto Carlos, WanderlĂ©a, Jerry Adriani e, Rosemary, entre outros. Seus maiores rivais sĂŁo os grupos de samba e bossa nova, aquartelados no Teatro Vila Velha de um lado e do outro o Cinema Roma, que era o templo do rock and roll, organizado por Waldir SerrĂŁo, O Big Ben.Em nome do namoro com a americana Edith Wisner, Raul resolve parar tudo e retomar os estudos e, em pouco tempo, prestar o vestibular (para passar num dos primeiros lugares) para a faculdade de Direito. “Eu queria provar Ă s pessoas, Ă  minha famĂ­lia, como era fĂĄcil isso de estudar, passar em exames. Como nĂŁo tinha a mĂ­nima importĂąncia.” TĂŁo sem importĂąncia que, em 1967, decide ao mesmo tempo casar com Edith e retomar a carreira com Os Panteras.Atendendo a um pedido de Jerry Adriani, Raul, Edith e Os Panteras partiram em viagem para o Rio, realizando um velho sonho. Conseguiram gravar, para a Odeon, o LP Raulzito e Os Panteras. Lançado em 1968, o disco foi ignorado tanto pela crĂ­tica quanto pelo pĂșblico.“Chegamos em fim de safra. NĂŁo entendĂ­amos o que estava acontecendo. Agnaldo TimĂłteo de um lado, Gil e Os Mutantes de outro. TocĂĄvamos coisas complicadas, minhas letras falavam de agnosticismo, essas coisas, e complicamos demais. NĂŁo tĂ­nhamos idĂ©ia do que era comercial em matĂ©ria de mĂșsica em portuguĂȘs.”Com o fracasso do disco, ficam algum tempo como banda de apoio de Jerry Adriani, atĂ© a dissolução do grupo. “SĂł sobrou eu. Os outros nĂŁo agĂŒentaram a barra e caĂ­ram fora”. Desiludido e psicologicamente abalado, Raul voltou para Salvador.”Em 1970, conheceu Evandro Ribeiro, diretor da CBS, hoje Sony Music. “Talvez eu tivesse trilhado o caminho da paranĂłia se nĂŁo tivesse tido a chance que tive. Conheci o diretor da gravadora CBS lĂĄ mesmo, na Bahia, e foi ele mesmo quem me deu oportunidade de estar em contato com a arte outra vez.” E lĂĄ se foi Raul, com Edith, de volta para o Rio; desta vez para trabalhar como produtor de discos na CBS. Durante um ano, Raul criaria mĂșsicas e discos de sucesso para Jerry Adriani, Trio Ternura, Renato e Seus Blue Caps, Tony e Frankie, Diana e SĂ©rgio Sampaio. “SĂ©rgio Sampaio foi o primeiro artista que eu realmente descobri. Acreditei muito nesse cara. Acreditei tanto que ele me incentivou a ser artista outra vez.” Em novembro daquele ano, nasceu Simone, a primeira filha.O incentivo de SĂ©rgio Sampaio levou Raul a produzir e lançar, em julho de 1971, aproveitando a viagem do presidente da CBS, o LP Sociedade da GrĂŁ-Ordem Kavernista – apresenta – SessĂŁo das 10, com participaçÔes do prĂłprio Raul, com SĂ©rgio Sampaio, Miriam Batucada, Edy Star.Isso lhe valeu a expulsĂŁo da CBS quando o presidente voltou. O disco entĂŁo sumiu, “misteriosamente”, do mercado.“Neste disco cada um cantava suas mĂșsicas em faixas separadas, num trabalho que resumia o caos da Ă©poca. Valeu a pena, apesar de ter vendido muito pouco. NĂłs nos divertimos muito. Foi tambĂ©m a primeira vez que eu fiz algo para ser consumido e do qual me senti paranoicamente orgulhoso e feliz. Como os Beatles, que aprenderam no estĂșdio, eu aprendi tudo na CBS, os macetes todos. Aprendi a fazer mĂșsica fĂĄcil, comercial, intuitiva e bonitinha, que leva direitinho o que a gente quer dizer.”Em setembro de 1972, no VII Festival Internacional da Canção, Ă  frente de um pĂșblico ĂĄvido por novidades, Raul, mais uma vez incentivado pelo amigo SĂ©rgio Sampaio, resolveu se tornar “popular”. Inscreveu no festival as cançÔes “Eu sou eu, Nicuri Ă© o Diabo”, defendida por Lena Rios e Os Lobos, e “Let me Sing, Let me Sing”, mistura de rock com baiĂŁo, interpretada pelo prĂłprio Raul, travestido de Elvis. Ambas foram classificadas.“Depois de sair da CBS, onde ganhava 4 mil cruzeiros por mĂȘs, decidi ser Raul Seixas. EntĂŁo usei, este Ă© o termo, aquele negĂłcio de brilhantina, do rock, do casaco de couro, como trampolim, como uma maneira de ser conhecido. Por que eu sĂł passei a existir depois daquela encenação, daquele teatro que eu fiz. Combinar rock com baiĂŁo foi a fĂłrmula certa para chamar a atenção. Mas foi sĂł o começo.”A classificação de “Let me Sing, Let me Sing” entre as finalistas, alĂ©m da excelente repercussĂŁo que Raul Seixas provocou no pĂșblico e na imprensa, garantiu a continuidade de sua carreira como cantor e compositor da Philips. A consagração ainda tardaria alguns meses; tempo durante os quais Raul atuaria ao velho estilo, como produtor (e, no caso, tambĂ©m como cantor, anĂŽnimo, sem crĂ©dito na capa) de um disco antolĂłgico de clĂĄssicos de rock and roll e da Jovem Guarda: Os 24 Maiores Sucessos da Era do Rock (selo Polyfar, 1973).Em 1975, esse disco seria reeditado com algumas alteraçÔes, como o nome de Raul na capa e um novo tĂ­tulo, 20 Anos de Rock, aproveitando a notoriedade de Raul. Mas o “buuum” sĂł viria mesmo com a explosĂŁo do compacto ”Ouro de Tolo”, (curiosidade: teve que ser prensado duas vezes em uma semana!). ”Ouro de Tolo” tinha uma letra autobiogrĂĄfica e ao mesmo tempo uma bofetada na face da classe mĂ©dia do paĂ­s (que trocava a verdadeira realização pelo acesso Ă s bugigangas comuns de consumo), naqueles tempos de Milagre Brasileiro.Contratado pela Philips (gravadora onde brilhavam os medalhĂ”es da MPB como Caetano, Gil, Gal etc…), Raul Seixas partiu para o primeiro ĂĄlbum solo, KRIG-HA, BANDOLO! O tĂ­tulo refere-se ao grito de guerra de Tarzan, que quer dizer: “cuidado, aĂ­ vem o inimigo”. Lançado em 1973 Ă© considerado pela crĂ­tica como um dos seus melhores trabalhos.“O LP KRIG-HA, BANDO-LO! foi feito todo de uma vez. A mĂșsica Ouro de Tolo foi lançada antes, por causa de uma jogada comercial da Philips, que remexeu na Ăłpera, que Ă© o LP, e dela retirou a parte que achava mais interessante. EntĂŁo, para mim, o valor e o gosto ficam por conta de todo o LP, porque ele Ă© o todo de um trabalho, onde todas as mĂșsicas se interligam e de onde Ă© quase impossĂ­vel vocĂȘ sĂł tirar e citar uma parte.”Raul Seixas e Paulo Coelho lançam Sociedade Alternativa em agosto, e dedicam-se com afinco aos estudos esotĂ©ricos, mergulhando fundo na obra do mago inglĂȘs Aleister Crowley. Raul anunciava que era hora de mudar o mundo e distribuĂ­a nos shows um gibi/manifesto chamado “A Fundação de Krig-ha”, ilustrado por Adalgisa Rios (esposa de Paulo, na Ă©poca). A Sociedade Alternativa, com sede alugada, papel timbrado e relatĂłrios mensais, chegou a anunciar a aquisição de um terreno em Minas Gerais, para a construção da Cidade das Estrelas, uma comunidade onde a lei Ășnica era “Faze o que tu queres, hĂĄ de ser tudo da lei.” A idĂ©ia da Sociedade Alternativa nĂŁo agradou a muitos e Raul foi preso e torturado pelo DOPS, tendo que deixar o paĂ­s.Raul, Paulo, Edith e Adalgisa decidiram partir para os Estados Unidos, onde fizeram contato com algumas personalidades.Enquanto isso aqui no Brasil, a mĂșsica “Gita” tocava de norte a sul do paĂ­s. E foi graças a esse sucesso que Raul e Cia. voltaram para o Brasil. Foi nessa Ă©poca que o casamento de Raul com Edith foi chegando ao fim, e ela decidiu voltar para os Estados Unidos, levando consigo a filha do casal.O sucesso de Gita deu a Raul Seixas o primeiro Disco de Ouro, com mais de 600 mil cĂłpias vendidas. O mesmo nĂŁo aconteceu com o disco seguinte: Novo Aeon (1975, Philips), que vendeu apenas 60 mil. “Foi a maior decepção, mas dei a volta por cima com HĂĄ 10 Mil Anos AtrĂĄs.”Raul conheceu, entĂŁo, outra americana, GlĂłria Vaquer (“Spacey Glow”), irmĂŁ de seu guitarrista Gay Vaquer. Casou-se com GlĂłria e, desta uniĂŁo, nasceu, no Rio de Janeiro, a segunda filha de Raul, Scarlet, em junho de 1976. Nesse ano lançou o ĂĄlbum HĂĄ 10 Mil Anos AtrĂĄs, com Raul maquiado na capa como um “sĂĄbio anciĂŁo”. Chegou entĂŁo ao fim a parceria com Paulo Coelho, embora conti-nuassem amigos (ou inimigos Ă­ntimos).Decidiu sair da Philips para outra gravadora, a recĂ©m-fundada WEA. Marcou esse perĂ­odo o rosto sem barba nem bigode (suas “marcas registradas”) e a relação com um novo parceiro (e antigo vizinho dos tempos do Rio), ClĂĄudio Roberto, professor de ginĂĄstica, poeta e cantor nas horas vagas. Juntos realizaram o LP O Dia em que a Terra Parou, em 1977. A crĂ­tica nĂŁo gostou. Foi dito que nĂŁo mantinha o mesmo “nĂ­vel” dos trabalhos anteriores. Mas os fĂŁs se deliciam com “Maluco Beleza”, “Sapato 36” e a faixa-tĂ­tulo. Raul chegou a fazer alguns shows, mas sem muito sucesso, devido Ă s crĂ­ticas ao LP. Foi entĂŁo que se separou de GlĂłria, que, a exemplo de Edith, tambĂ©m voltou aos Estados Unidos com a filha Scarlet.Voltou de lĂĄ mais gordo e com uma nova companheira, TĂąnia Menna Barreto. Com ela dividiu parceria em seu novo ĂĄlbum, Mata Virgem (1978, WEA). O disco trazia de volta Paulo Coelho , mas a mĂĄ divugação atrapa-lhou o LP e a crĂ­tica tambĂ©m nĂŁo ajudou.As mudanças em sua vida pessoal e profissional somadas a problemas de saĂșde, abalaram Raul. Para recuperar-se da pancreatite, agravada pelo consumo de bebidas alcoĂłlicas, Raul Seixas resolveu passar alguns meses na fazenda dos pais em Dias D’Avilla, interior da Bahia.SĂŁo Paulo o recebeu de braços abertos. Iniciou, entĂŁo, uma sĂ©rie de shows pela capital e interior do estado paulista. Na Zona Sul da cidade de SĂŁo Paulo, nasceu, em 1981, a terceira e Ășltima filha de Raul, Vivian.Chegou a fazer uma temporada no Teatro Pixinguinha com sucesso absoluto.Em 1979 faz seu Ășltimo ĂĄlbum para a WEA, Por Quem os Sinos Dobram, em parceria com o amigo Oscar Rasmussen. Raul saiu da gravadora levando sua secretĂĄria de imprensa, a carioca Ângela Costa, hoje mais conhecida como Kika Seixas.Raul assinou um novo contrato com uma velha conhecida sua, a CBS e, em 1980, lançou o ĂĄlbum Abre-te, SĂ©samo. O disco vendeu razoavelmente, porĂ©m bem menos do que merecia. Raul e Kika decidiram morar em SĂŁo Paulo e, com a ajuda de Jair Rodrigues, conseguiram alugar uma casa no bairro do Brooklin.Ainda em 81, Raul rescindiu o contrato com a CBS por pedirem que dedicasse o prĂłximo disco a Lady Diana – ela era ”o assunto do momento”. Nessa Ă©poca, Sylvio Passos, com 18 anos, comunicou a Raul Seixas que havia fundado o Raul Rock Club. Ele ficou surpreso, e passou a participar ativamente do que denominaria de Raul Seixas Oficial FĂŁ-Clube.Sem gravadora, mas com um pĂșblico enorme e fiel, apresentou-se para mais de 150 mil pessoas em 13 de fevereiro de 1982 no Festival MĂșsica na Praia, em Santos, SĂŁo Paulo. Mas Raul andava insatisfeito e mergulhava cada vez mais na bebida, o que levou ao cancelamento de shows e crises de hepatite. Em maio de 82, apresentou-se tĂŁo alcoolizado em Caieiras, interior de SĂŁo Paulo, que acabou sendo tomado por impostor de si mesmo, sendo preso e ameaçado pelo delegado da cidade.Deprimido, sem um contrato com uma gravadora e ainda com problemas de saĂșde, Raul, juntamente com Kika, desenvolveu o projeto da Ăłpera-rock Nuit e saiu batendo de porta em porta, visitando todas as gravadoras. Nada aconteceu. Chegou ao cĂșmulo de ouvir de um diretor artĂ­stico a seguinte frase: “JĂĄ estou vacinado contra Raul Seixas.” Magoado, Raul voltou para o Rio e ficou alguns meses num apartamento em Copacabana.AtĂ© que JoĂŁo Lara Mesquita, jovem diretor do EstĂșdio Eldorado e fĂŁ incondicional de Raul, resolveu realizar um antigo projeto e convidou o Ă­dolo para gravar. Raul, Kika e a filha Vivian entĂŁo retornaram para SĂŁo Paulo, e, em abril de 1983, o mĂșsico lançou o ĂĄlbum Raul Seixas. O disco trazia tambĂ©m uma faixa gravada, ao vivo, durante um show realizado no Sociedade Esportiva Palmeiras, onde Raul Seixas contou, atravĂ©s das mĂșsicas, a histĂłria do rock and roll para mais de 10 mil pessoas.Em 1983, lançou o livro As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor, dividido em trĂȘs partes: a primeira, um diĂĄrio escrito entre os sete e os quatorze anos, no qual nota-se um grande conhecimento de rock and roll; na segunda parte, uma sĂ©rie de contos feitos entre os doze e os vinte e um anos; e, finalmente, na terceira, uma histĂłria em quadrinhos, chamada A Lei dos Assassinos da Montanha que, segundo Raul, era um bom exemplo de humor negro.Com o sucesso do disco, do livro e da turnĂȘ pelo Brasil, Raul e Kika realizaram uma viagem aos Estados Unidos para acompanhar de perto o que estava acontecendo musicalmente por lĂĄ. Voltaram com a bagagem cheia e inspiradĂ­ssimos. Raul entĂŁo assinou novo contrato, dessa vez com a Som Livre e, em junho de 1984, lançou o ĂĄlbum MetrĂŽ Linha 743.O penĂșltimo casamento de Raul foi-se rompendo. A sua saĂșde tambĂ©m nĂŁo andava boa. Mais uma vez ele decidiu voltar para Salvador, como fizera em 1978, para se recupe- rar. Depois de curta permanĂȘncia em Salvador, voltou para SĂŁo Paulo com nova companheira, Lena Coutinho.Em SĂŁo Paulo, junto com Lena, procurou uma nova gravadora, mas as portas do mundo artĂ­stico pareciam estar fechadas novamente para Raul. Enquanto isso, milhares de fĂŁs e amigos permaneceram na expectativa de novidades. Em SĂŁo Paulo, no ano de 1985, o Raul Rock Club (o FĂŁ-Clube Oficial) lança o ĂĄlbum Let me Sing my Rock and Roll, o primeiro disco produzido e distribuĂ­do independentemente por um fĂŁ-clube brasileiro, disputado hoje a peso de ouro por fĂŁs e colecionadores.Durante o ano de 1986, Raul e Lena continuaram Ă  procura de uma gravadora e, finalmente, com a ajuda de amigos assinaram contrato para dois ĂĄlbuns com a Copacabana. PorĂ©m, os problemas com a saĂșde atrapalharam as sessĂ”es de gravação no estĂșdio e o LP, que todos esperavam para esse ano, acabou sendo lançado sĂł no inĂ­cio de 1987. O disco trazia como tĂ­tulo o grito de guerra de rock and roll: Uah-Bap-Lu-Bap-Lah-BĂ©in-Bum!O disco tocou de norte a sul do paĂ­s e mais uma vez, Raul Seixas era notĂ­cia, ocupando lugares de destaque na mĂ­dia e, o melhor, sua mĂșsica estava na boca do povo. Contudo, continuava desaparecido dos palcos e da TV devido Ă  sua saĂșde precĂĄria (em parte culpa do problema do abuso de bebidas alcoĂłlicas).A mĂșsica “Cowboy Fora-da-Lei” estourou nas paradas de sucesso ganhando videoclipe no FantĂĄstico e a sua inclusĂŁo na trilha sonora da novela das sete da Rede Globo. A mĂșsica revelava uma “quase” paranĂłia de Raul, onde diz: “MamĂŁe, nĂŁo quero ser prefeito/ pode ser que eu seja eleito/ e alguĂ©m pode querer me assassinar.”A mĂșsica “NĂŁo Quero Mais Andar na ContramĂŁo”, provou que Raul nĂŁo estava mais a fim de maluquices e que seu papo agora era paz e sossego, no aconchego do lar… sossego que virou tĂ©dio. Marcelo Nova, para tirĂĄ-lo desse tĂ©dio, convidou-o para viajar para Salvador, onde iria se apresentar.Raul, que estava afastado dos palcos hĂĄ trĂȘs anos (sua Ășltima apresentação, ao vivo, foi em dezembro de 1985, em SĂŁo Caetano do Sul, SĂŁo Paulo), aceitou o convite. Na capital baiana,iniciaram juntos uma sĂ©rie de 50 shows, que visitou os quatro cantos do Brasil. Uma aventura que acabou resultando no disco A Panela do Diabo, lançado dois dias antes do falecimento de Raul.A convite do discĂ­pulo e amigo Marcelo Nova, entĂŁo vocalista e letrista do grupo baiano Camisa de VĂȘnus, Raul Seixas participou da gravação do ĂĄlbum que o grupo preparava para lançar, dividindo vocais e parceria com Marcelo Nova na mĂșsica “Muita Estrela, Pouca Constelação”, referindo-se ao cenĂĄrio pop brasileiro de maneira desdenhosa.No ano seguinte (1988), mostrou que ainda estava “vivo”, lançando, em setembro, o ĂĄlbum A Pedra do GĂȘnesis, que falava da controvertida Sociedade Alternativa.Segunda-feira, 21 de agosto de 1989, nove horas da manhĂŁ. Dalva Borges da Silva, a empregada de Raul, chegou ao apartamento nĂșmero 1003, do EdifĂ­cio Aliança, Zona Central de SĂŁo Paulo, e encontrou Raul Seixas morto em sua cama. Dalva imediatamente entrou em contato com o mĂ©dico e a famĂ­lia de Raul. A notĂ­cia se espalhou e logo as emissoras de rĂĄdio e TV divulgaram o fato.FĂŁs, jornalistas e amigos dirigiram-se ao prĂ©dio onde Raul residia. Raulzito havia falecido duas horas antes da chegada de Dalva ao prĂ©dio, de parada cardĂ­aca, causada pela pancreatite de que sofria hĂĄ dez anos.O corpo foi levado para o PalĂĄcio das ConvençÔes do Anhembi, Zona Norte de SĂŁo Paulo, onde foi velado durante toda a noite e madrugada a dentro. Às oito horas da manhĂŁ do dia seguinte o corpo seguiu num jatinho para Salvador, onde foi sepultado Ă s 17 horas no CemitĂ©rio Jardim da Saudade.Passados tantos anos de sua grande viagem, Raul Seixas continua mais vivo do que nunca. Desde seu falecimento em 21 de agosto de 1989, o nĂșmero de pessoas interessadas em sua vida e obra vem aumentando consideravelmente. Pessoas de todas as faixas etĂĄrias e classes sociais se organizam nos inĂșmeros fĂŁ-clubes criados para homenageĂĄ-lo. Casas culturais, praças, ruas, parques e viadutos recebem seu nome.Revistas, pĂŽsteres e cerca de 20 livros enfocando sua vida e obra continuam no mercado. Todos os tĂ­tulos de sua imensa discografia jĂĄ foram reeditados em CD, e novos tĂ­tulos sĂŁo lançados constantemente. Programas de rĂĄdio e TV, romarias ao CemitĂ©rio Jardim da Saudade, em Salvador, passeatas, carreatas e inĂșmeros eventos acontecem anualmente em todo o Brasil nas datas de nascimento e morte, 28 de junho e 21 de agosto, respectivamente.É por esses e por inĂșmeros outros motivos que decididamente Raul Seixas estĂĄ e continuarĂĄ vivo.



Nenhum comentĂĄrio:

Postar um comentĂĄrio